A energia elétrica no Brasil possui atualmente uma das tarifas mais altas do planeta principalmente por ser considerada muito distante da realidade econômica dos seus consumidores, tendo boa parte desse alto custo influenciada pelos tributos federais e estaduais, encargos setoriais, subsídios da conta CDE-Conta de Desenvolvimento Energético e mix de compras de energia no mercado regulado. Recentemente a conta de energia ficou ainda mais “salgada”, devido ao impacto de aumento de 52% na bandeira vermelha patamar 2 que deve ser utilizada pelo menos até novembro deste ano em função da atual crise hídrica nos grandes reservatórios das usinas hidrelétricas. O acréscimo das bandeiras ocorreu para custear o despacho de usinas termoelétricas, bem mais onerosas e poluentes, principalmente neste momento crítico em que se tem utilizado as usinas térmicas de toda ordem e custo, sejam elas a gás natural, a óleo combustível, a carvão mineral e a óleo diesel.
Mato Grosso possui no segmento residencial uma tarifa cerca de 15% superior à média nacional. Em 22 de abril deste ano A ANEEL-Agência Nacional de Energia Elétrica reajustou em 8,9% na média as tarifas de energia da distribuidora de Mato Grosso, represando alguns custos que serão pagos mais à frente, e ainda decretou em junho bandeira vermelha 2, bem como reajustou em julho esta bandeira em 52%, passando de um custo de R$ 6,24 para R$ 9,49 para cada 100 kWh consumidos. E a energia pode ficar ainda mais cara em função de uma nova Consulta Pública aberta pela ANEEL sobre a necessidade de ajustes no custo desta bandeira e evitar possíveis déficits futuros. Trata-se da Consulta Pública 041/2021 resultante destas incertezas existentes no cenário à frente, o que com certeza provocará alguns ajustes na metodologia da ANEEL do cálculo das bandeiras. Esta Consulta da ANEEL propõe duas possibilidades para a ocorrência da Bandeira Vermelha Patamar 2 nos meses seguintes: manter os R$ 9,492 por 100 kWh ou elevar o valor para R$ 11,50 por cada 100 kWh. O que é ruim poderá ficar pior. O fato é que estamos num momento delicado: o consumidor está e poderá ser mais impactado ainda do ponto de vista econômico. Ou seja, estamos falando de um reajuste anual da tarifa mais bandeira vermelha 2 acrescidos do reajuste desta bandeira, e já passamos de 22% de impacto na tarifa num momento que enfrentamos uma pandemia sem precedentes, com desemprego alto, perda de renda da população e a maioria das empresas do país em situação crítica.
O consumo residencial aumentou bastante em função do trabalho em home-office nesta pandemia. Mais uso de computadores, impressoras, iluminação, ar condicionado, ventiladores, chuveiro, televisão e nesta cadeia do consumo, as pessoas acabam usando mais o micro-ondas, geladeiras, e ainda sobrecarregam estes equipamentos com o famoso “abre e fecha”. Adicionalmente em Mato Grosso devido às altas temperaturas o reflexo é ainda mais sentido. Segundo dados da ANEEL de 2019, em média no país uma residência consome cerca de 164 kWh por mês enquanto em Mato Grosso essa média é de 231 kWh por mês. Ou seja, aqui em nosso estado a média chega a ser 40% maior devido principalmente às altas temperaturas e com isso um maior consumo de energia nessa “cadeia do calor”. Então é uma boa hora começar a exercitar o uso consciente da energia, pois quando chegar o período mais quente no estado, que vai agosto a novembro, o peso no bolso do consumidor será ainda mais pesado, podendo aumentar de 30 a 50% o consumo da energia elétrica, dependendo do perfil de cada consumidor e da quantidade de equipamentos que utiliza, notadamente aparelhos de ar condicionado.
A energia consumida é o produto da potência do equipamento em Watts pelo seu tempo de uso, resultando no famoso kWh. Então, a orientação é “gestão”. Gestão do tempo de uso dos equipamentos e gestão para o uso da energia de forma consciente e inteligente. Entendemos ainda que pelo preço que se paga da conta de energia, o consumidor não pode e não deveria ficar sabendo do tamanho da mesma só no final do mês, com o gasto já comprometido. Já passou da hora de ser regulamentado pela ANEEL para que todos os consumidores, grandes ou pequenos, tenham instrumentos de gestão, que poderia ser viabilizado através de uma plataforma amigável de baixo custo, utilizando interface com os medidores inteligentes e uma rede wi-fi via celular/computador, para que o consumidor possa fazer a gestão em tempo real de qual cômodo ou equipamento da residência esteja consumindo mais energia. A partir disto então criar uma consciência para mudar hábitos e economizar. Até o momento, muito se falou, mas não avançamos neste aspecto gerencial, infelizmente. O consumidor pode ajudar neste momento, a si mesmo e ao país, mas precisa ter o seu consumo na “palma da mão” e on line.
A rede inteligente ou smart grid deve ser implementada pelas distribuidoras com a devida prioridade, sair dos “projetos pilotos”, pois proporciona a integração da rede de distribuição com os medidores eletrônicos inteligentes. Com uma gestão remota e efetiva em tempo real, o consumidor poderia acompanhar dia a dia e, se estivesse gastando muito, perceber antes e poderia administrar melhor o uso da energia até o final do mês, inclusive cuidando para manter-se numa faixa de tributação de ICMS menor, pois atualmente as alíquotas variam dependendo da faixa de consumo de 0 a 27% no estado (cálculo por dentro). Além de gerenciar o consumo pela internet ou outro meio, os medidores eletrônicos inteligentes viabilizarão a medição remota do consumo evitando a necessidade de leitura presencial todo mês e ainda enviariam um alarme para as distribuidoras, alertando que o consumidor estaria com uma falta de energia, por exemplo, contribuindo para que a energia seja restabelecida mais rapidamente e a apuração dos indicadores de continuidade e qualidade que medem a eficiência das distribuidoras sejam mais consistentes. Auxiliaria ainda as distribuidoras a identificarem possíveis desvios de energia devido a fraudes, cujo custo acaba recaindo em grande parte para todos os consumidores.
Nesta crise hídrica mais do que nunca algumas lições precisam ser aprendidas, dentre elas está a implementação deste mecanismo de gestão. Por enquanto, o consumidor conta somente com si próprio, meio no “escuro” sem outros mecanismos mais eficientes para tentar reduzir sua conta mensal e, há um bom caminho a explorar neste sentido. A gestão do tempo de uso dos equipamentos como ressaltado é um ponto central. O que se espera é que o consumidor não deixe de utilizar a energia elétrica, contudo que evite o seu desperdício.
Outra questão é o consumidor quando possível gerar sua própria energia, de forma limpa e renovável e ainda ajudar o país. Assim foi fundamental a implementação da legislação pela ANEEL para a micro e minigeração distribuída através da Resolução 482 que proporcionou justamente que o consumidor gerasse sua própria energia no sistema de compensação de créditos ou net metering, principalmente a partir da energia solar fotovoltaica. Contudo, é importante frisar que estas iniciativas devem vir acompanhadas de um bom dever de casa com relação a eficiência energética. Podemos gerar nossa própria energia, mas devemos utilizá-la racionalmente e sem desperdícios.
Na pandemia temos passado mais tempo em casa, o que aumenta nossa responsabilidade sobre o uso mais consciente da energia elétrica, agora com um novo ingrediente, a crise hídrica e de energia. Assim, economizar energia é uma questão complexa e varia muito de pessoa para pessoa, pois existem aspectos culturais. A energia elétrica é um produto essencial e possibilita conforto e bem estar. Trabalhar em casa com calor é complicado. Então as pessoas tendem a manter a qualidade do ambiente que tinham nos escritórios.
Logicamente que as pessoas e empresas em sua maioria estão passando por dificuldades financeiras neste período. Aliado a isto, a conta de energia é “salgada” com forte pressão de tributos, encargos setoriais/subsídios e bandeiras tarifárias. Então de certa forma, as pessoas estão fazendo esforços para pagarem as contas em dia e tentando economizar um pouco, mas depende muito da situação. O uso não racional da energia elétrica é um fator que influencia muito no desperdício. Alguns aspectos são culturais, como já dito, e demandam tempo para as mudanças acontecerem. Outro fator é a utilização de equipamentos ineficientes e que consomem mais energia. Às vezes compra-se um equipamento por ser mais barato, mas no longo prazo, o consumidor acaba gastando mais com a energia elétrica consumida pelo mesmo.
Então o tripé equipamentos mais eficientes com certificação do PROCEL- Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica, hábitos conscientes e projetos inteligentes, devem estar bem alinhado. É preciso agir estrategicamente e com inteligência. Desta forma estaremos reduzindo o consumo, o gasto e ainda protegendo o meio ambiente e as futuras gerações. É extremamente preocupante esta situação num momento de dificuldades econômicas das pessoas e das empresas, seja do segmento residencial, industrial, comercial/serviços, rural e etc. Fora isto, o Tesouro Nacional deveria aportar uma parte dos recursos para minimizar esta situação que está influenciando muito no bolso do consumidor e, onerando toda a cadeia de consumo através da inflação gerada. Então, o consumidor acaba pagando de todas as formas!
Com tamanho impacto o consumidor, sem muita escolha, precisa avaliar como prioridade a possibilidade de economizar energia, que sabemos é muito difícil já ressaltamos. A conta está subindo muito e poderá pesar ainda mais no seu bolso. No bolso de quem já paga via tarifa o que foi planejado, remunerando os ativos dos investimentos necessários para a expansão e melhoria de toda a cadeia do setor elétrico através das geradoras, transmissoras e distribuidoras. Estamos apenas no início da crise, temos ainda todo o segundo semestre de 2021 e um próximo ciclo hidrológico que poderá ser insuficiente para restabelecer os reservatórios a níveis satisfatórios para 2022. O modelo tarifário em vigor está esgotado, onde o consumidor cativo não tem liberdade de escolha e assume todos os riscos e custos, seja na sobra como ocorreu em 2020, seja na falta de energia como agora em 2021. A modernização do setor elétrico é urgente para, dentre outras coisas, abrir o mercado para todos os consumidores e gerar concorrência neste monopólio, inclusive os pequenos que são a grande maioria. Neste momento, o consumidor já está no seu limite para economizar energia considerando as ferramentas que possui. Poderia fazer mais, mas com instrumentos adequados de gestão e, assim, com certeza os resultados poderiam se maximizados.
Por fim, uma reflexão se torna muito importante considerando o atual modelo tarifário no país. Até onde a redução do consumo de energia “beneficia” realmente os consumidores neste modelo? A ANEEL determina que as distribuidoras apliquem 0,5% de sua receita operacional líquida no PEE-Programa de Eficiência Energética, que é custeado pelos consumidores. As distribuidoras selecionam os contemplados e os Conselhos de Consumidores de Energia não participam desta seleção. As distribuidoras aos olhos do consumidor estariam realizando “ações sociais” para benefício dos mesmos como distribuição de geladeiras, lâmpadas e etc, porém está tudo dentro da tarifa que pagamos. No ano passado foi aprovado um socorro às distribuidoras de R$ 15 bilhões que serão pagos pelos consumidores em 5 anos com CDI+3,9%, a chamada Conta Covid. Cadê os riscos do negócio para as empresas? Agora façamos uma reflexão: Este “socorro” foi justificado em parte para compensar a redução do consumo devido a pandemia da Covid 19. Ressalta-se que as ações de “incentivo” das distribuidoras para os consumidores reduzirem sua conta são sempre bem superficiais, com o objetivo de apenas de “cumprir tabela”, não fogem do senso comum. A pergunta que fica é: Se os consumidores resolvessem reduzir seus consumos por exemplo de 15 a 20%, para aliviarem seus bolsos e ajudar o pais nesta crise, que compensações poderiam obter? Pela lógica do “socorro”, os consumidores pagariam esta conta também por estarem fazendo uso consciente da energia? Muito provavelmente as distribuidoras iriam requerer na ANEEL o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos? É para se pensar!
Formas de economizar energia elétrica em seu dia a dia
Valorizar a iluminação natural;
Trocar as lâmpadas pelas do tipo LED;
Ar condicionado: a temperatura ideal deve ficar em 23 graus com o ambiente fechado e limpar regularmente o filtro;
Chuveiro elétrico: tomar banhos de até 5 minutos e utilize a temperatura morna no verão;
Aparelhos em stand-by: retirar os aparelhos eletrônicos da tomada quando possível
Ter atenção ao estado dos eletrodomésticos;
Diminuir o uso de aparelhos como ferro elétrico e máquina de lavar. Juntar a maior quantidade de roupas para utilização em uma única vez.
Teomar Estevão Magri, Engenheiro Eletricista com MBA em Gestão de Negócios, Especialista e Consultor em Energia, membro do Conselho de Consumidores de Energia Elétrica de Mato Grosso-Concel MT.